Economia
Milei elogia Irlanda, mas ignora nuances econômicas importantes
Apesar das referências de Milei ao PIB da Irlanda, economistas alertam para a complexidade dos números, ressaltando que a realidade é bem diferente.
O presidente Javier Milei tem se mostrado aspirante a um modelo econômico semelhante ao da Argentina, espelhando a trajetória da Irlanda nas últimas três décadas. No entanto, a realidade da Irlanda é mais complexa do que as afirmações simplistas de Milei.
Como um outsider libertário que assumiu o poder no ano passado, Milei faz questão de destacar as referências ao país europeu em seus discursos. Por outro lado, enquanto o produto interno bruto (PIB) da Argentina deve registrar uma queda de 3% este ano, uma recuperação robusta é esperada para 2025, à medida que seu plano de austeridade começa a fazer efeito.
“Meu modelo é semelhante ao da Irlanda,” afirmou Milei em um discurso durante uma conferência em Mar del Plata. Ele destacou que “a Irlanda passou de ser o país mais miserável da Europa há 40 anos para hoje ter um PIB per capita 50% maior que o dos Estados Unidos.” Contudo, essa comparação ignora as particularidades da economia irlandesa.
A embaixada da Irlanda em Buenos Aires já percebeu o interesse dos argentinos sobre o modelo econômico irlandês. Esta semana, o economista Alan Barrett, diretor do Instituto de Pesquisa Econômica e Social de Dublin, esteve em solo argentino para compartilhar suas experiências e conhecimentos sobre como a Irlanda obteve seus avanços econômicos.
Desde que Milei começou suas referências à Irlanda, as autoridades irlandesas relataram um “interesse sustentado” por parte dos argentinos, que se concentram no PIB da Irlanda e em seu ambiente favorável a negócios. Um porta-voz do departamento de assuntos estrangeiros irlandês disse: “O objetivo da visita foi compartilhar insights sobre o modelo econômico, incluindo desafios e sucessos.”
No entanto, enquanto Milei foca no PIB per capita, Barrett adverte que essa medida não é a mais precisa para entender a realidade da economia. Ele explica que os números são inflacionados pela renda corporativa das multinacionais, o que não reflete a realidade doméstica irlandesa.
Barrett argumenta que a Irlanda prefere analisar a renda nacional bruta (RNB), uma métrica que realmente tenta capturar o desempenho econômico, excluindo o impacto da renda corporativa. “O PIB não reflete a realidade vivida na Irlanda,” afirmou Barrett em uma entrevista após sua palestra em Buenos Aires. “Quando olhamos para a RNB, a Irlanda ainda apresenta um desempenho muito bom, mas não tão extraordinário quanto o PIB per capita sugere.”
Desde 2015, o PIB da Irlanda aumentou 87%, enquanto a RNB cresceu 72%, de acordo com a agência de estatísticas do país. O Ministério das Finanças irlandês tem utilizado a demanda doméstica ajustada para calcular a atividade subjacente, considerando gastos pessoais, governamentais e de investimento.
Barrett reconheceu que comparar Argentina e Irlanda é uma tarefa ingrata, como comparar maçãs a laranjas. A Irlanda se beneficia de significativos investimentos corporativos e de sua adesão à União Europeia, enquanto a Argentina continua presa a um modelo protecionista, dependente das exportações de commodities. Mas, o laço cultural é inegável, com a maior comunidade de descendentes irlandeses na América Latina localizada na Argentina.
Além de uma baixa alíquota de imposto corporativo, o economista irlandês destacou que os investimentos em educação e infraestrutura, áreas que Milei cortou, são fundamentais para atrair multinacionais como Apple e Meta. “Na Irlanda, grande parte da despesa governamental melhora a capacidade produtiva,” concluiu Barrett, enfatizando que os investimentos em educação são cruciais para o sucesso econômico da nação.
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