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Kim Jong Un em ação: o ditador enfrenta enchente e intensifica propaganda
Enchentes devastadoras no noroeste da Coreia do Norte chamam atenção para esforço de Kim Jong Un em se mostrar presente. Confira os detalhes desse cenário crítico.
O líder Kim Jong Un mergulha na lama, navega em um apertado barco de resgate em um rio revolto e pousa helicópteros militares em um pista saturada devido à chuva.
A máquina de propaganda da Coreia do Norte se reiventa para mostrar Kim ao lado de seus cidadãos, enquanto enfrenta a devastação de uma enchente que atingiu o noroeste do país. Segundo o ministério sul-coreano, estima-se um “considerável número de vítimas”.
Essa estratégia pode indicar uma tentativa do governo de desviar a responsabilidade por um desastre possivelmente maior do que o divulgado. As imagens veiculadas pela mídia estatal sugerem que Kim está profundamente preocupado com seu povo e também visam elevar seu culto de personalidade.
“As ações recentes de Kim são sem precedentes na Coreia do Norte”, afirma Cho Han-bum, pesquisador sênior do Instituto Coreano de Unificação Nacional, vinculado ao governo sul-coreano.
A cidade de Sinuiju, um importante centro comercial com conexão à China, e o condado de Uiju sofreram com chuvas torrenciais e inundações na última semana de julho. Os danos incluem cerca de 4.100 casas destruídas, estradas e ferrovias devastadas, além de aproximadamente 3.000 hectares de terras agrícolas comprometidas, de acordo com relatos da mídia estatal norte-coreana.
Cerca de 5.000 pessoas foram resgatadas, conforme a Agência Central de Notícias da Coreia (KCNA), que não mencionou mortes. A KCNA fez grandes esforços para dar destaque ao envolvimento de Kim, que foi visto supervisionando voos de helicópteros militares para garantir a segurança das pessoas resgatadas.
“As vítimas resgatadas se emocionaram ao vê-lo esperando por elas em um aeroporto chuvoso, aplaudindo e derramando lágrimas de gratidão”, relatou a KCNA.
O desastre ocorreu paralelamente às comemorações do 27 de julho, data que marca o fim dos combates da Guerra da Coreia entre 1950-1953, enquanto Kim participava de uma festa musical em Pyongyang.
Embora o número exato de vítimas não tenha sido divulgado, a TV Chosun informou que centenas podem ter perecido, citando uma fonte governamental não identificada. A mídia norte-coreana se absteve de mencionar qualquer morte.
A região é um dos principais centros de produção de grãos do país, o que significa que a perda de terras agrícolas pode agravar a insegurança alimentar, em uma nação onde cerca de 40% da população enfrenta desnutrição, segundo o Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas.
No entanto, o evento ocorre em um momento de ascensão para Kim, com sinais de recuperação econômica em meio a sanções internacionais. Informações revelam que materiais e alimentos estão fluindo da Rússia em troca de munições que Pyongyang está fornecendo para apoiar Moscou na guerra na Ucrânia.
“Essas enchentes não impactarão a liderança de Kim de forma negativa. Na verdade, apesar do efeito nocivo na economia, se tornam uma excelente oportunidade para propaganda de liderança”, comenta Rachel Minyoung Lee, pesquisadora sênior do Programa 38 North do Stimson Center.
As imagens na mídia estatal mostram Kim observando através de uma janela de um veículo enquanto inspeciona os danos causados pelas enchentes. Também há registros dele a bordo de um barco repleto, sem colete salva-vidas.
“Não há forma mais eficaz de consolidar a imagem de Kim como um líder que cuida do povo, mesmo se arriscando, do que através de fotos e vídeos que mostram seu comando em meio ao caos, atravessando áreas alagadas”, analisa Lee, ex-analista da CIA.
Kim já tomou medidas para redirecionar a culpa, demitindo o ministro de Segurança Pública e sugerindo punições a outros, conforme relatado pela KCNA.
Embora ele tenha sido retratado supervisionando operações de resgate em desastres anteriores, é raro a mídia sob controle rígido do regime mostrar Kim enfrentando situações tão adversas e perigosas.
“Kim Jong Un se beneficia da mesma forma que qualquer político em situações de desastre: criando a percepção de que está no controle, que se importa com as pessoas e está atuando em favor dos afetados”, finaliza Martyn Williams, pesquisador sênior no programa coreano do Stimson Center. “A mídia estatal não hesita em mostrá-lo em momentos de vulnerabilidade.”
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