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Japão vive reviravolta política: partido no poder perde a maioria pela 1ª vez desde 2009
O partido do primeiro-ministro Shigeru Ishiba perdeu o controle da câmara baixa, desafiando a estabilidade da coalizão governamental e o futuro político do país.
O Japão está em meio a uma crise política após a falha do primeiro-ministro Shigeru Ishiba em garantir uma vitória em uma eleição antecipada. Pela primeira vez desde 2009, a coalizão governante não conseguiu manter a maioria no parlamento.
O escândalo financeiro que abalou a confiança dos eleitores no Partido Liberal Democrático (PLD) levou a essa perda crítica. O PLD e seu parceiro de coalizão, Komeito, não conseguiram os 233 assentos necessários na câmara baixa, conforme reportado pela emissora pública NHK, uma tendência confirmada por outras pesquisas.
O apoio ao PLD caiu drasticamente após a revelação de que membros do partido estavam enriquecendo secretamente a partir de doações. Como consequência, a incerteza política deve resultar em turbulência para o iene e o mercado de ações japonês, além de levantar questões sérias sobre o futuro da liderança de Ishiba.
“Não conseguimos dissipar o descontentamento do público com a questão dos fundos políticos”, declarou Ishiba logo após os resultados. Questionado sobre a possibilidade de formar uma nova coalizão, ele afirmou que nenhuma decisão foi tomada, mas demonstrou disposição para colaborar com outros partidos se as políticas fossem coerentes.
A contagem de votos revelou que o PLD e o Komeito juntos conquistaram apenas 210 assentos, enquanto a oposição totalizou 240. O Partido Democrático Constitucional do Japão se destacou com 145 assentos ganhos, conforme indicado pela NHK.
Esse resultado gera desafios para o Banco do Japão, que precisa decidir o momento certo para as futuras alterações nas taxas. Espera-se que o banco central mantenha as taxas inalteradas na reunião do dia 31 de outubro.
As pressões internas sobre o PLD para substituir Ishiba aumentam, especialmente em um cenário onde um novo líder poderia buscar uma política fiscal mais expansionista, como destacou Nobuyasu Atago, economista-chefe da Rakuten Securities. “Se isso acontecer, a continuidade de aumentos nas taxas de juros pode se tornar inviável,” alertou.
Atualmente, nenhum partido se mostrou disposto a se juntar à coalizão, e líderes de partidos de oposição disseram não ter interesse em negociar, embora estivessem abertos a colaborações pontuais em questões específicas.
O grande vencedor da eleição foi o CDP, que ampliou significativamente seu número de assentos de 98 para um total robusto. Yoshihiko Noda, líder do CDP, já manifestou suas intenções de formar governo se a coalizão governante perder a maioria.
Embora o PLD permaneça como o maior partido no parlamento, sua grande prova será para Ishiba encontrar uma nova estratégia para assegurar um governo estável. As negociações entre partidos podem levar semanas, sem garantias de um desfecho positivo.
“Isso pode criar um impasse nas deliberações legislativas — um resultado que tende a ser negativo para o iene e o Nikkei, pelo menos no curto prazo”, comentou Tim Waterer, analista-chefe da KCM Trade.
Ishiba ascendeu à liderança do PLD recentemente, buscando distanciar-se do escândalo que prejudicou a popularidade de seu antecessor, Fumio Kishida. Ele tomou medidas drásticas ao proibir certos parlamentares envolvidos no escândalo de se candidatar novamente, visando restaurar a credibilidade do partido. Contudo, a necessidade do apoio desses parlamentares, muitos dos quais enfrentaram derrotas, pode tornar sua posição precária.
“Se perdermos a maioria, buscaremos cooperação o mais amplamente possível”, afirmou Shinjiro Koizumi, responsável pela campanha do PLD, após as pesquisas de boca de urna. “É crucial que o PLD se transforme, refletindo sobre esse duro julgamento.”
A tentativa de Ishiba de consolidar um mandato também foi dificultada por mudanças em posturas políticas, especialmente no que diz respeito à normalização das taxas do Banco do Japão.
“Perder a maioria pela primeira vez desde 2009 é um sinal claro da ineficácia da administração Ishiba em implementar suas políticas, além da repercussão do escândalo de fundos,” afirmou Rintaro Nishimura, consultor do The Asia Group.
O caminho que Ishiba precisará percorrer será repleto de demanda dos aliados em potencial, que podem impor condições rigorosas pela cooperação. O Partido Democrático para o Povo, por exemplo, deseja reformas fiscais significativas antes de entrar em negociações.
“Se o PLD precisar de apoio de outros partidos, quais concessões Ishiba pode fazer?” questionou Nishimura. “É improvável que os partidos vejam valor em salvar uma embarcação à deriva.”
O PLD enfrenta um cenário análogo ao que ocorreu em 1993, quando perdeu a maioria, mas continuou como o principal partido no parlamento. Após longas negociações, uma coalizão de sete partidos de oposição foi formulada, removendo o PLD do poder. No entanto, essa coalizão desmoronou em menos de um ano, permitindo que o PLD retornasse ao governo.
Mesmo que Ishiba consiga apoio suficiente para continuar como primeiro-ministro, a complexidade do cenário torna difícil a busca por objetivos políticos, como o aumento do financiamento para iniciativas regionais e elevações de impostos para custear a defesa. Uma erosão da maioria pode compelir o PLD a adotar medidas mais populistas.
“A pressão por políticas fiscais expansionistas é forte entre as oposições, além de demandas por cortes de imposto sobre consumo. Não me surpreenderia se o PLD fosse arrastado nessa direção,” analisou Yuichi Kodama, economista do Instituto de Pesquisa Meiji Yasuda. “Se o orçamento suplementar for excessivamente focado em subsídios, pode desviar sua atenção de questões de longo prazo, como a consolidação fiscal.”
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