A cúpula climática das Nações Unidas, agendada para novembro no Brasil, está prestes a se tornar um verdadeiro caos logístico. O evento, destinado a reunir líderes mundiais e cerca de 50 mil participantes no coração da floresta amazônica, já é alvo de críticas e preocupações, tendo menos de 100 dias para sua realização.
O Brasil enfrenta uma série de críticas de nações preocupadas com a falta de quartos de hotel e os preços exorbitantes de acomodações em Belém, a cidade escolhida não por sua infraestrutura turística, mas pela sua proximidade com a floresta. A secretaria da COP30, por exemplo, adiou uma reunião para discutir as questões de hospedagem, e até o momento não anunciou uma nova data.
Uma carta, contendo 19 páginas e revisada pela Bloomberg News, foi enviada a países membros da ONU. Nela, os organizadores descartaram a possibilidade de mudar a sede. “Não haverá local alternativo. A COP30 não será transferida de Belém”, disseram, pois afirmam que a cidade já tem um número suficiente de leitos para os participantes.
A carta traz respostas a 48 perguntas de delegações, com quase metade delas abordando a preocupante questão do alto custo e escassez de acomodações. Um porta-voz da COP30 se negou a confirmar a autenticidade da carta.
Até o dia 8 de agosto, os organizadores disponibilizaram informações sobre 53 mil leitos em Belém, incluindo 14.547 em hotéis, 6.000 em navios de cruzeiro, 10.004 em aluguéis de temporada e 22.452 pelo Airbnb. O governo promete que mais opções serão disponibilizadas nos sites de reserva BNetwork e Qualitours.
Os preços dispararam, com tarifas já superando as de hotéis de luxo no Rio de Janeiro. Por exemplo, reservar um apartamento de um quarto em Belém durante a COP30 custa impressionantes 1,4 milhão de reais (US$ 267.380). Em contraste, um quarto no Copacabana Palace no Rio custa 96.223 reais.
Esses preços elevados levantam preocupações sobre a exclusão de nações mais pobres. Pacotes especiais foram prometidos para delegações de pequenas ilhas e países em desenvolvimento, que representam mais de um terço dos membros da ONU. Estas delegações terão acesso a 15 quartos por noite, com tarifas que variam entre US$ 100 e US$ 200. As demais delegações terão garantidos apenas 10 quartos por noite, com preços entre US$ 200 e US$ 600.
“O Brasil é uma democracia de mercado, o que limita intervenções na rede hoteleira e em propriedades privadas,” destacou a carta dos organizadores.
As demais respostas do Brasil até o momento não têm tranquilizado os participantes. As questões logísticas parecem estar dificultando os progressos nas negociações e ameaçam a visão inicial da COP30, que visava a inclusão de uma gama diversificada de vozes, incluindo comunidades indígenas.
Claudio Angelo, coordenador de políticas internacionais do Observatório do Clima, declarou que essa crise logística contradiz a ideia de uma COP inclusiva, alertando que a cúpula pode se tornar uma das mais excludentes na história da convenção climática da ONU.
Críticos como Angelo afirmam que os obstáculos logísticos podem comprometer a legitimidade de quaisquer acordos que possam ser firmados em Belém, especialmente se barrar a participação de representantes de países sem recursos financeiros. O presidente da COP30, André Corrêa do Lago, reconheceu que facilitar acomodações é uma questão política crucial.
Dois navios de cruzeiro — Costa Diadema e MSC Seaview — funcionarão como hotéis flutuantes no Porto de Outeiro, cada um com capacidade para cerca de 3.000 hóspedes. No entanto, esse arranjo criou preocupações sobre o isolamento dos participantes, devido à distância dos navios até o local da cúpula. “A viagem não deve levar mais do que 30 minutos”, tentaram garantir os organizadores na carta.
A escolha de realizar a COP30 em uma cidade com infraestrutura limitada foi uma decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que se recusa a retroceder diante das pressões internacionais para mudar o local do evento. “Decidimos realizar a COP em Belém para que as pessoas possam ver a verdadeira Amazônia”, afirmou Lula em recente discurso em Brasília.
Frente às dificuldades estruturais, o Brasil decidiu dividir a programação da COP30. A cúpula de líderes de dois dias ocorrerá antes das principais negociações, agora programadas para começar em 11 de novembro. Essa mudança visa reduzir a pressão por acomodações para os chefes de Estado e suas equipes.
A Associação Brasileira da Indústria de Hotéis no Pará prioriza as delegações e critica o que chama de campanha de desinformação contra a realização do evento em Belém. O presidente da associação, Tony Santiago, revelou que estão disponíveis 535 quartos em hotéis cinco estrelas com preços entre US$ 100 e US$ 300. Ele também incentivou o compartilhamento de acomodações entre as delegações.
Santiago admite que os preços dos hotéis em Belém aumentaram drasticamente, algumas vezes ultrapassando quatro vezes o preço normal. Corrêa do Lago, por sua vez, mencionou uma média de aumento de até 15 vezes. Contudo, o representante dos hotéis assegura que esses aumentos extremos estão começando a ser revertidos à medida que mais quartos tornam-se disponíveis.
“Há preconceito contra Belém e a Amazônia. Acredita-se que a COP deve ocorrer apenas em hotéis luxuosos e confortáveis. Isso é hipocrisia. Para tratar de clima, precisamos ir à Amazônia, vivenciar a floresta e sentir a realidade”, concluiu Santiago.

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