Pequim fez um alerta claro: as empresas locais devem evitar o uso dos processadores H20 da Nvidia (NVDC34), especialmente em projetos ligados ao governo. Essa medida complica ainda mais os esforços da Nvidia para reverter bilhões de dólares em receita que foram perdidos na China após a administração Trump ter revertido a proibição de vendas.
Recentemente, autoridades chinesas enviaram alertas a diversas empresas, desencorajando o uso dos chips H20, de acordo com fontes anônimas que entenderam a sensibilidade da situação. O apelo foi especialmente enfático em relação ao uso desses semicondutores para projetos governamentais ou relacionados à segurança nacional, afetando tanto empresas estatais quanto privadas.
Apesar disso, essas recomendações não configuram uma proibição absoluta do uso dos H20. Especialistas do setor indicam que as empresas chinesas ainda têm interesse por esses chips, reconhecendo seu desempenho em aplicações de inteligência artificial (IA) que são vitais. Na última segunda-feira (11), Trump observou que o processador, que ele classifica como “obsoleto”, ainda possui mercado na nação asiática.
A Nvidia, junto com a Advanced Micro Devices (A1MD34), obteve recentemente autorização do governo dos EUA para voltar a vender chips de IA de menor desempenho à China, sob a condição controversa de repassar 15% de sua receita ao governo americano.
No entanto, mesmo com o respaldo da administração Trump, as empresas enfrentam um desafio iminente, pois estão sob pressão do governo de Pequim para priorizar chips feitos localmente. Essa estratégia de Pequim também se estende à AMD, embora ainda não esteja claro se os avisos especificamente mencionaram o chip MI308 da AMD.
As ações da fabricante chinesa de chips de IA, Cambricon Technologies Corp., saltaram até o limite diário de 20% com a divulgação dessa recomendação, impulsionando também os papéis de outras companhias como a Semiconductor Manufacturing International Corp.
A postura do governo chinês pode restringir as possibilidades de Trump de transformar essa reversão da política de controle de exportações em um ganho financeiro para o tesouro americano, algo que exemplifica a natureza transacional da sua administração em questões de segurança nacional, que historicamente são tratadas como não-negociáveis.
Entretanto, as empresas chinesas podem não estar dispostas a abrir mão dos semicondutores locais. “Os chips dos fabricantes domésticos estão evoluindo rapidamente em termos de qualidade, mas podem não ser tão versáteis em certas aplicações que a indústria de IA da China pretende priorizar”, comentou Homin Lee, estrategista macro sênior da Lombard Odier em Cingapura. Lee ainda previu uma demanda “forte” pelos chips que a administração Trump permitiu que a Nvidia e a AMD comercializassem.
Pequim questionou, em algumas de suas comunicações, os motivos que levam as empresas a optarem pelos chips Nvidia H20 em detrimento das alternativas locais, e se eles realmente encontraram problemas de segurança no hardware da Nvidia. Estes avisos coincididem com reportagens da mídia estatal que levantam questionamentos sobre a segurança e confiabilidade dos processadores H20. Reguladores da China discutiram essas preocupações diretamente com a Nvidia, que repetidamente negou que seus chips possuam tais falhas.
Por enquanto, a orientação mais rigorosa de Pequim se aplica a aplicações sensíveis, semelhante à maneira como foram impostas restrições a veículos da Tesla Inc. e iPhones da Apple Inc. em certas instituições por motivos de segurança. O governo chinês também havia anteriormente banido o uso de chips da Micron Technology Inc. em infraestruturas críticas.
É possível que a China amplie essa orientação mais severa contra a Nvidia e a AMD para um maior número de contextos, conforme uma fonte com conhecimento direto das deliberações, embora essas discussões ainda estejam em uma fase inicial.
A AMD optou por não comentar a respeito dos avisos de Pequim, enquanto a Nvidia declarou em um comunicado que “o H20 não é um produto militar e não é utilizado para infraestrutura governamental.” A Nvidia ressaltou que a China possui um suprimento abundante de chips locais e “não depende de chips americanos para suas operações governamentais.”
O Ministério da Indústria e Tecnologia da Informação da China e a Administração do Ciberespaço da China não responderam a pedidos de comentário sobre esta matéria, que se baseia em entrevistas com mais de seis fontes familiarizadas com as discussões políticas de Pequim. A Casa Branca também não se manifestou sobre o tema fora do horário comercial.
A postura do governo chinês suscita dúvidas quanto às justificativas da administração Trump sobre a liberação dessas exportações, ocorrendo poucos meses após a proibição dessas vendas. Vários altos funcionários dos EUA alegaram que a reversão na política foi consequência de negociações comerciais, entretanto, Pequim indicou publicamente que a reabertura das vendas do H20 não fazia parte de nenhum acordo bilateral. Os recentes avisos chineses às empresas sugerem que o país pode não ter buscado essa concessão de Washington inicialmente.
As preocupações de Pequim são reforçadas por dois motivos. Primeiro, os oficiais temem que os chips da Nvidia possam ter capacidades de rastreamento de localização e desligamento remoto — uma alegação que a Nvidia nega enfaticamente. Enquanto isso, funcionários ligados a Trump estão avaliando se questões de rastreamento de localização poderiam auxiliar no combate ao contrabando suspeito de componentes restritos para a China, e legisladores apresentaram um projeto que exigiria verificação de localização para chips de IA avançados.
Além disso, Pequim está intensamente empenhada em desenvolver suas capacidades de fabricação de chips e quer fortalecer a preferência das empresas por chips locais em vez de ocidentais. Autoridades já tinham solicitado anteriormente que as companhias optassem por semicondutores fabricados localmente em vez do H20 da Nvidia, conforme relatado pela Bloomberg em setembro passado, e introduziram padrões de eficiência energética que o chip H20 não atende.
A Nvidia desenvolveu o chip H20 especificamente com o mercado chinês em mente, em resposta a anos de restrições dos EUA sobre a venda de seu hardware de ponta, tentando limitar o acesso de Pequim à IA que poderia beneficiar as forças armadas do país. Embora o H20 possua menor capacidade de computação em comparação com os principais produtos da Nvidia, sua largura de banda de memória é valiosa na fase de inferência do desenvolvimento de IA, na qual os modelos detectam padrões e tomam decisões.
Esse contexto fez do chip um item desejado por gigantes como Alibaba e Tencent, especialmente numa fase em que concorrentes internos como a Huawei estão lutando para produzir componentes avançados suficientes para satisfazer a demanda. Segundo analistas do governo Biden — que consideraram, mas não implementaram restrições às vendas do H20 — a falta de acesso a esse chip da Nvidia poderia encarecer entre três e seis vezes o custo para as empresas chinesas que querem operar inferência em modelos complexos de IA.
“É evidente que Pequim está utilizando incertezas regulatórias para criar um mercado grande o bastante que absorva a oferta da Huawei, enquanto ainda permite a compra do H20 para demandas emergentes”, avaliou Lennart Heim, pesquisador focado em IA no RAND, sobre a pressão da China para que empresas abandonem chips americanos. “Isso sinaliza que as alternativas domésticas ainda são insatisfatórias, mesmo sob a pressão da China sobre fornecedores internacionais.”
No discurso realizado na última segunda-feira, Trump afirmou que a Huawei já oferece chips que são comparáveis ao Nvidia H20, ecoando posicionamentos de outros membros de sua administração que justificaram a liberação das vendas do H20, em parte, com base nesse argumento. Os EUA devem manter o ecossistema de IA da China dependente de tecnologia americana menos sofisticada pelo maior período possível, afirmam essas autoridades, com o intuito de restringir a receita e o conhecimento que a Huawei poderia adquirir ao expandir sua base de clientes.
Alguns membros da administração, no entanto, expressaram resistência a essa lógica, conforme informou a Bloomberg, argumentando que reiniciar as exportações do H20 apenas fortaleceria os campeões tecnológicos da China e aumentaria o poder computacional da nação. O secretário de Comércio, Howard Lutnick, e outros dirigentes da equipe de Trump, também afirmaram que a concessão do H20 fazia parte de um acordo para facilitar o acesso americano a minerais raros da China — mesmo que antes a equipe Trump tenha negado que tal arranjo estivesse em pauta. “Conforme os chineses entregam seus ímãs, os H20 serão liberados”, destacou Lutnick no mês passado. O secretário do Tesouro, Scott Bessent, divulgou no final de julho que a questão dos ímãs havia sido “resolvida.”
Não se levou mais de uma semana após a declaração de Bessent para que as primeiras licenças para a venda do Nvidia H20 e do AMD MI308 fossem emitidas — um movimento que se deu logo após a reunião do CEO da Nvidia, Jensen Huang, com o presidente, quando as duas empresas concordaram em compartilhar parte de sua receita da China com o governo dos EUA.

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