Os investidores em ações, que foram levados de volta ao mercado por um rali impressionante, estão prestes a perceber que o verdadeiro desafio está apenas começando. Embora a recuperação aguda dos ativos de risco — impulsionada por negociações comerciais promissoras, resiliência da economia e queda da volatilidade — tenha gerado um certo otimismo, muitos permanecem céticos. Atrás dessa trégua de três meses nas tensões entre EUA e China, o risco de uma nova e aguda correção no mercado paira no ar.
“Os mercados estão imersos em incertezas enquanto líderes mundiais correm para fechar acordos durante a pausa tarifária de 90 dias”, afirma a equipe de pesquisa da TS Lombard, composta por Steven Blitz e Davide Oneglia. “O que realmente importa é o potencial de danos duradouros durante e após essa fase delicada da guerra comercial”.
A recuperação das ações, notadamente a partir das mínimas de abril, pegou muitos de surpresa — ou mesmo fora de alcance. Uma confluência de riscos inesperados, dados ambíguos e narrativas conflitantes culminou em um rali de dimensões extraordinárias. A rapidez com que caímos e subimos de acordo com os mercados de 2020, durante a pandemia, se repete, sugerindo que o S&P 500 pode se recuperar mais rápido do que em ciclos anteriores.
Pressão em Alta
O salto das ações na segunda-feira evidencia a pressão que incide sobre os investidores com baixa exposição. Os papéis atrelados ao crescimento global e setores sensíveis à China dispararam como um foguete em meio a uma onda de compras impulsivas.
Dados da Bloomberg mostram que muitos ativos de maior risco, que acumularam perdas de até 60% desde o pico do S&P 500 em fevereiro, voltaram ao centro das atenções. “As ações estão subindo com a diminuição das tensões comerciais, mas são os papéis de qualidade duvidosa que estão chamando a atenção”, destacam os operadores da mesa de ações do Goldman Sachs Group Inc., ressaltando que a atividade dos clientes cresceu 71% na segunda-feira.
Além disso, estratégias sistemáticas estão auxiliando no crescimento do rali. Esses investidores utilizam modelos quantitativos para comprar ações, ignorando riscos potenciais das manchetes. Esses fluxos de capital levam o mercado para locais onde a relação risco-retorno se torna desfavorável para aqueles que usam avaliações tradicionais ou hesitam em tempos de incerteza econômica.
Até mesmo investidores de varejo, conhecidos por serem os primeiros a sair e os últimos a entrar em ralis, mantiveram suas compras durante a queda.
Cautela entre os Profissionais
No entanto, os investidores profissionais parecem longe de se exporem totalmente ao mercado de ações. Dados da Comissão de Negociação de Futuros de Commodities dos EUA indicam que gestões de ativos mantêm posições cautelosas nos futuros do S&P 500.
Estratégias de seguimento de tendência, como as dos fundos CTA (Commodity Trading Advisors), podem estar apoiando a recuperação dos ativos de risco, mas sem pressa em aumentar a exposição, segundo estrategistas do UBS Group AG, entre eles, Nicolas Le Roux.
“Dada a velocidade e a força dessa recuperação, os CTAs não estão indo rapidamente às compras”, disse a equipe do UBS. “Eles preferem esperar que algumas tendências se firmem antes de decidirem investir mais”.
Enquanto isso, dados da Prime Desk do Goldman Sachs evidenciam que as ações globais registraram, na terça-feira, o segundo maior volume de compras líquidas por hedge funds nos últimos cinco anos. Isso foi “impulsionado pela recompra de posições vendidas e, em menor grau, por compras líquidas”, conforme destacados em nota aos clientes.
Esse descompasso no posicionamento sinaliza que o “short squeeze” pode não ter terminado. Estrategistas do Deutsche Bank AG afirmam que o anúncio comercial entre EUA e China já justifica um aumento no apetite por risco. “Isso supera qualquer expectativa que o mercado poderia ter em março”, revelou a equipe. “Mantenha-se otimista”.
Indicadores Técnicos Favoráveis
Os indicadores técnicos também sinalizam que o rali pode ter longevidade. A amplitude do mercado ainda não está excessiva, e pontos de reversão, como a média móvel de 200 dias, apresentaram pouca resistência.
Além disso, recuperações em forma de “V” têm tendência de deixar investidores cautelosos para trás. Dados da SentimenTrader revelam que, embora o desempenho a curto prazo possa ser fraco, retornos são promissores para quem se mantém investido.
“Com base no comportamento desde a mínima de abril, o rali parece mais sustentável do que o habitual”, afirma a SentimenTrader. “É claro que nada é garantido, e estamos apenas lidando com probabilidades. A boa notícia é que as probabilidades pendem para o lado dos otimistas”.
Riscos à Vista
Entretanto, essa corrida também carrega seus riscos. Quanto mais forte o rali, mais assimétrioco se torna o cenário — preços elevados e baixa volatilidade aumentam a probabilidade de uma reversão dolorosa caso as boas notícias cessem. Assim, a relação risco-retorno pode voltar a níveis desfavoráveis para muitos.
Esse risco se intensifica, considerando que os fatores que estão impulsionando essa alta ainda carecem de dados sólidos. Qualquer indício de que a economia foi impactada, mesmo que de forma mínima, pelas tarifas de curto prazo pode fazer com que o otimismo se dissipe rapidamente — e levar as ações a uma estagnação nas compras.
“Nem tudo está perfeito”, avisou Charlie McElligott, executivo chefe de estratégia de ativos cruzados da Nomura Securities International Inc. As coisas podem mudar rapidamente à medida que nos aproximamos do final da pausa tarifária, principalmente se o presidente Trump “decidir provocar novas crises uma vez mais”.

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